sexta-feira, 26 de abril de 2019

SONHO NAUFRAGADO


Aos dezessete anos de idade eu não conhecia o mar, nunca tinha ido a uma praia, somente conhecia lagoas, piscinas e rios, mas o mar jamais tinha visto de perto, apenas pela velha televisão que tínhamos em casa em preto e branco, marca videobel.
Aos sábados eu não trabalhava e a tarde adorava assistir filmes de aventuras sobre o mar, povoados distantes perdidos no mundo e foi em um desses sábados que assistindo uma reportagem sobre marinheiros embarcando em um grande navio que me despertou uma vontade enorme de ser marinheiro.
Assim que terminou a reportagem dei um pulo enorme da poltrona e gritei bem alto:
- Já sei, vou ser marinheiro e viajar pelo mundo e voltarei somente daqui a alguns anos para este pedaço de chão!
Minha mãe e meu pai arregalaram os olhos de espanto, caminharam lentamente até mim e disseram:
Ora garoto, sabemos que você tem um espírito aventureiro, mas querer entrar na marinha de guerra já é demais, vai descansar um pouco quem sabe você muda de ideia.
A mente borbulhava em pensamentos em querer ser marinheiro a qualquer custo e assim ao anoitecer fui dormir e sonhei a noite toda que eu estava embarcando em um grande navio de guerra para um local ignorado. Eram centenas de grumetes todos uniformizados de branco embarcando no porto e despedindo-se dos familiares que abanavam lenços entre lágrimas.
No outro dia, durante o café matinal que fazíamos aos domingos reunidos em família comuniquei que iria alistar-me na marinha de guerra quando chegasse a data específica do começo do alistamento.
Procurei saber se eu podia alistar-me na cidade de São Paulo e fiquei sabendo que poderia alistar-me somente na cidade de Santos e assim os dias foram passando e eis que o dia do começo do alistamento militar chegou e eu já estava com todos os documentos preparados para poder embarcar na velha rodoviária de São Paulo que naquela época ficava na estação da Luz, no centro velho de São Paulo.
Anotei o nome do quartel, o endereço, datilografei enfiei no bolso da velha calça Jeans e desci a serra com um sentimento de vitória em poder sentir que meus sonhos começavam a levantar âncoras.
 Apresentei-me no quartel e entreguei todos os documentos a um oficial que pediu para eu aguardar que iriamos fazer uma prova para poder aferir o nosso conhecimento e em seguida teríamos que voltar para fazer o exame médico em outro dia.
Entre idas e vindas de São Paulo para Santos foram umas quatro viagens após a primeira viagem eu já não pagava mais a passagem de ônibus, apenas mostrava o alistamento militar e seguia viagem gratuitamente.
As medidas da farda foram tiradas, os números dos sapatos anotados e estava tudo certo para poder engajar na marinha e foi quando fui informado que iria servir a marinha em uma cidade chamada Ladário como grumete no estado do Mato Grosso do Sul.
Fiquei super espantado, pois pensava que serviria em Santos ou Rio de Janeiro e fui falar com o comandante e ele deu um sorriso debochado e disse: Ora soldado, aqui você apenas obedece e já está definido para onde você vai ou prefere ir para o exército?
Um pouco abalado pelas circunstâncias disse que gostaria de ir para o exército e ele pediu para eu esperar que faria a minha transferência. Aguardei alguns minutos e foi quando o comandante apareceu com uma folha pedindo para eu apresentar-me ao exército que ficava no Parque Dom Pedro II. Passados alguns dias apresentei-me no exército e deram-me um atestado de excesso de contingente e meu sonho tinha acabado de naufragar naquele instante.

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