quarta-feira, 7 de julho de 2021

GALINHAS



Hoje é muito fácil comprar galinhas e mais tranquilo ainda prepará-las, é só chegar no supermercado apontar as “penosas”, pesar e pronto. Algumas galinhas já vêm cortadas e temperadas o que facilita enormemente a vida de qualquer dona de casa.

Existiu uma época, isto lá pela década de 1960 que tal facilidade não existia, então a maioria das famílias, principalmente aquelas de origem do interior de qualquer cidade do nosso país comprava as galinhas vivas para serem abatidas em casa.

Eu com meus sete anos ficava horrorizado com tal atrocidade diante das queridas penosas indo para um enorme tacho com água escaldante para serem depenadas e decepadas e eu  diante de tanta crueldade ficava imaginando: “Como pôde! Mamãe é tão amável conosco e com todos e faz isto com as pobres galinhas”, mas quando as mesmas chegavam ao meu prato, abandonava toda a minha piedade pelas galinhas e compreendia perfeitamente a atrocidade.

Minha mãe Thereza e meu pai José sempre comprava as galinhas caipiras vivas para serem preparadas e servidas no nosso almoço dominical e meu sofrimento antecipado começava quando meu pai pedia para mamãe comprar as galinhas numa granja perto da nossa residência na rua Mangalô, no bairro Parada Inglesa em São Paulo.

No dia 23 de dezembro de 1962, meu pai pediu para minha mãe ir até à granja e comprar três galinhas caipiras bem gordas. Minha mãe resolveu levar-me até a granja e saímos de casa sob uma tênue garoa característica na cidade de São Paulo naquela época, chegamos na casa onde vendia galinhas, galos, patos e marrecos, e minha mãe escolheu cautelosamente três enormes galinhas caipiras e pediu para pesar para saber o preço. Era muito engraçado ver as galinhas querendo fugir do prato da balança do japonês granjeiro, esperneando e cacarejando e eu torcendo para as mesmas voarem e saírem da granja, ganharem a rua e posteriormente irem para bem longe daquele local, mas sempre acabavam sendo dominadas pelas mãos hábeis do japonês que abria o enorme viveiro onde estavam as galinhas e pedia para minha mãe escolher qual galinha iria levar para casa. Adorava os cacarejar das penosas e entre várias penas voando o granjeiro retirava as galinhas escolhidas, pesava e amarrava um pedaço de barbante espesso nas pernas das penosas escolhidas e entregava para minha mãe.

Tinha um plano maravilhoso para dar liberdade para as queridas galinhas e pedi para minha mãe quase que suplicando se podia levar as galinhas puxando pelo barbante e mamãe foi lacônica diante de um sonoro não. Insisti e ela concordou em deixar eu levar apenas uma galinha por um determinado trecho da calçada do bairro, o que já amenizou muito meu coração e encheu me de alegria. Iria soltar o barbante na primeira esquina e deixar a mesma fugir, este era meu plano para dar liberdade para aquela inofensiva galinha.

Era muito engraçado, eu puxando o barbante pelas ruas do bairro Parada Inglesa em São Paulo, sob os olhares curiosos das pessoas e a galinha não obedecendo aos meus comandos e mamãe sorrindo e pedindo que eu fosse atrás da galinha e a espantasse para que a mesma andasse, mas não poderia soltar a cordinha, senão a mesma iria para a rua. Tentei, foram várias tentativas em vão e a galinha repentinamente empacou, aí espantei a penosa e soltei o barbante, levei a mão a cabeça em sinal de espanto e medo e a mesma foi para o meio da rua onde um carro atropelou a penosa e matou parte do nosso almoço natalino.

Fiquei muito espantado e triste com o fim trágico dos meus planos e comecei a chorar e mamãe calmamente passou a mão na minha cabeça, sorriu e seguimos para casa e eu entre muitos soluços encobertos de tanta culpa pela morte da penosa.

Chegamos em casa e mamãe soltou as duas galinhas num cercadinho num pequeno quintal de terra onde não existia muro e ficava no alto, pois morávamos num sobrado que fazia divisa com uma enorme casa em construção.

As galinhas até pareciam felizes, pois, ciscavam para cá e para lá, e eu observando atentamente e mentalizando planos mirabolantes para libertar aquelas duas infelizes “penosas” que em breve iriam para o tacho fervente.

A ideia era a seguinte: iria pedir para minha mãe para dar milho para as galinhas e posteriormente iria espantá-las, assim evitaria o sofrimento cruel das galinhas. Cheguei com um ar de súplica para minha mãe e pedi se podia dar alguns milhos para as galinhas e a resposta foi um prudente e lacônico“Não”, insisti choramingando e ela disse:

— Não Luiz! Está chovendo e você pode cair lá para baixo. Insisti, quase que ajoelhando aos pés da minha mãe.

— Mas mamãe, deixa-me dar apenas alguns grãos de milho para as galinhas eu tomo muito cuidado!

— Não e pronto! Falou mamãe um tanto contrariada com aparência de brava e foi preparar o jantar. Fiquei alguns minutos com um punhado de grãos de milho na mão e resolvi contrariar minha mãe e entrei sorrateiramente no cercadinho para alimentar e soltar posteriormente as galinhas. Repentinamente escorreguei na terra molhada e fui parar lá embaixo sobre um monte de areia. Fiquei alguns minutos gemendo e gritando por socorro. Quando mamãe ouviu-me, desceu as escadas do sobrado onde morávamos correndo e chegou assustadíssima no local onde eu havia caído, levantou-me, deu uma sonora bronca e subi escorado nos braços da minha mãe gemendo de dor, com várias escoriações e um braço quebrado. Seguimos para o hospital onde radiografaram o meu braço, fizeram vários curativos e enquanto os enfermeiros engessavam o meu braço ficavam cacarejando e olhando e sorrindo para mim que além de muito triste ainda eu sentia a enorme culpa por ter contrariado minha mãe. Nunca devemos contrariar nossas mães. Mãe tem sempre razão, portando jamais contrarie sua mãe, nem que for por apenas algumas galinhas!








sexta-feira, 2 de julho de 2021

OS BAILINHOS DE GARAGEM DA DÉCADA DE 70


 Estávamos vivendo a melhor época que já existiu neste planeta, época dos anos dourados de 1970.

Em 1972 eu tinha 15 anos e já trabalhava com carteira profissional assinada em uma Companhia de Seguros na Praça Manoel da Nóbrega no centro da cidade de São Paulo como Office-boy.

A minha vida não era nada fácil, pois, trabalhava de dia e estudava a noite o curso Ginasial, (Hoje Ensino Fundamental) no Ginásio Estadual Cidade de Hiroshima em Itaquera.

Na minha classe existia uma linda garota que chamava Rosely e eu desde o primeiro dia de aula fiquei apaixonado pela Rosely. Rosely era uma garota jovem, tinha 15 anos, era magra, morena, cabelos negros compridos, estatura mediana e detentora de uns olhos verdes maravilhosos.

Meu grande problema naquela época é que existia vários pretendentes em querer namorar a Rosely e a disputa entre nós garotos daquela época era concorrida e fazíamos de tudo para estar ao lado da linda garota Rosely.

Naquela época existia um baile que fazíamos na garagem da nossa casa nos finais de semana, geralmente aos sábados à noite e convidávamos todas as lindas garotas que conhecíamos para participar.

Eu nunca tinha feito um “bailinho” na garagem coberta na minha casa, embora já tinha participado de vários outros bailinhos nas casas de alguns colegas. Os meus sentimentos pela Rosely cada dia que passava aumentava mais, resolvi fazer um bailinho na minha casa com o consentimento da minha mãe e do meu pai para tentar conseguir namorar a menina mais linda da escola.

Contei sobre o bailinho para o Zezinho que também estudava na mesma escola para ajudar-me a preparar o bailinho na minha casa e ele ficou muito feliz e prontificou a emprestar o som, alguns discos de vinil e algumas fitas cassete para fazermos o baile e ainda prontificou em providenciar alguns convites feitos em cartolina.

Na sexta-feira que antecedeu o bailinho o Zezinho levou seu lindo equipamento de som, vários discos de vinil e fitas cassete para minha casa e quando foi no sábado de manhã lá estávamos nós montando toda a estrutura do baile. Corri até a casa da dona Margarida, nossa vizinha e emprestei alguns bancos de madeira e algumas cadeiras, uma pequena mesa foi colocada estrategicamente num canto da garagem para colocarmos o aparelho de som, enormes caixas de som foram distribuídas pela garagem e uma enorme lona amarela foi colocada na frente da garagem para garantir um pouco nossa privacidade.

Quando pensei que tudo já estava preparado para o bailinho o Zezinho começou a mostrar todos os discos de vinil e as fitas cassete e pediu para eu ajudar a escolher as músicas que eu gostaria de ouvir durante o baile.

Deu um nó na minha garganta e fiquei um pouco envergonhado em dizer que de música pouco eu entendia e que eu poderia apenas apontar algumas músicas que gostaria de ouvir e dançar durante o bailinho.

Assim o Zezinho foi colocando os discos de vinil e as fitas cassete no som e fomos escolhendo as músicas, que eram uma mais linda que a outra e após escolhermos umas vinte músicas o Zezinho disse. Pronto, já está tudo anotado aqui no caderno, agora e só aguardar o bailinho começar e o restante deixa comigo.

Naquele dia tudo foi feito com muito esmero, desde a lavagem da garagem, alguns enfeites foram colocados nas rústicas paredes e às 16:00 tudo já estava preparado para receber as lindas garotas convidadas para o bailinho de garagem.

O Zezinho era perfeccionista e entendia muito de som e naquela época era ele que promovia todos os bailinhos de garagem da periferia sem remuneração alguma, pelo simples fato de ver um amigo ou amiga feliz lá estava o querido amigo Zezinho a ajudar e preparar o bailinho da garagem da minha casa.

Após tudo montado na garagem o Zezinho foi se arrumar para o baile e eu entrei em casa cantarolando uma música chamada Dancing Queen do conjunto Abba e minha mãe disse:

— Que felicidade é esta meu filho! Nunca te ví assim! E respondi:

— Sabe mãe hoje está sendo o dia mais feliz da minha vida, pois, irei começar a namorar a menina mais linda da minha escola! Minha mãe sorriu e disse:

Que lindo! Fico feliz por você e quero logo conhecer minha nora e ver se ela é realmente tão bonita como você diz.

Tomei um demorado banho, passei um desodorante comprado para épocas especiais e fui me trajar. Coloquei calças boca de sino azul listrada de branco, uma camisa gola Olímpica branca com o meu nome bordado na parte da frente em letras pequenas, calcei um sapato com salto carrapeta bem lustrado e coloquei um cinto de couro com uma fivela enorme, passei brilhantina no cabelo, penteei cuidadosamente repartindo o mesmo ao meio. Pronto, eu já estava preparado para receber a minha princesa.

Quando se aproximou das 18:00 o Zezinho chegou e começou a testar o som e as primeiras pessoas começaram a chegar e eu dava Boas-vindas a todos que chegavam, entravam e ficavam quietinhos sentados nos bancos de madeira conversando baixinho para não atrapalhar os ouvidos afinadíssimos do nosso DJ Zezinho.

Eu estava ao lado do Zezinho apreciando a habilidade do mesmo com a preparação do som e de olho nas pessoas que iam chegando e foi quando o Zezinho disse:

Luiz, olha para trás e vê quem está chegando. Olhei e meu coração disparou. Era a Rosely que tinha chegado trajando um lindo vestido amarelo e uma sandália prata, cabelos soltos e exalando um perfume de um odor inefável.

Carinhosamente dei um beijo nas mãos da Rosely e ela disse:

Nossa, quanta cordialidade! Obrigado Luiz. Ela entrou e ficou conversando com uma colega de classe e após alguns minutos o bailinho começou com uma música chamada: Rock and Roll Lullaby do cantor BJ Thomas e eu rapidamente convidei a Rosely para dançar aquela música e para a minha surpresa a mesma aceitou.

O baile estava muito animado e eu já tinha dançado várias músicas com as colegas de classe e vizinhas, mas meus olhos sempre estavam direcionados para a querida Rosely.

Sentei-me sutilmente ao lado da Rosely e entre uma conversa e outra eu disse:

Rosely, você aceita comprometer-se comigo? Ela deu uma sonora gargalhada e disse: O que significa isto Luiz?

Muito envergonhado falei baixinho: significa namorar. O que diz?

Ela ficou pensando e colocou as mãos no queixo e disse: necessito pensar Luiz, afinal são tantos pretendentes que fico até envergonhada. Posso dar a resposta depois?

Um pouco triste disse que sim e o baile terminou e cada um foi para sua casa. Passados alguns dias quando cheguei na sala de aula a Rosely disse que necessitava falar comigo. Ai pensei, pronto ela vai dizer que não quer namorar comigo.

Ela convidou-me para ir até o bebedouro da escola beber água com ela e eu a acompanhei e fiquei aguardando um Não. Abaixou-se para beber água e quando ergueu a cabeça para engolir a água, ficou me olhando, olhando e inesperadamente deu um beijo na minha boca. Pronto o "sim" já estava garantido. Namoramos muito tempo até que em um determinado dia ela se apaixonou pelo Zezinho e fui preparar mais um bailinho para conseguir outra namorada. O difícil era quando eu ia a um bailinho e encontrava o Zezinho  animando o bailinho ao lado da linda Rosely. Até hoje quando recordo da minha musa Rosely, várias músicas daquela época ecoam na minha mente e fico bailando mentalmente a sorrir dos maravilhosos momentos vividos durante os bailinhos de garagem na década de 70.

LIBERDADE

  Há tempos que venho sendo acordado pelo mavioso canto de um pássaro na velha jaqueira existente no quintal da casa onde eu moro. Acordava,...