Após trabalhar trezentos e sessenta e cinco dias em uma pequena empresa em janeiro de mil novecentos e noventa e oito, com o chefe mais chato do mundo, ter que bater o “bendito” ponto, cartão, crachá e ultimamente passarmos apenas o dedo e nossa impressão digital detectar toda a nossa assiduidade. Ônibus lotados, metrô sob um calor infernal, trens parando constantemente na grande metrópole São Paulo, finalmente consegui sair de férias!
Acordei no primeiro dia de férias meio assustado sem saber o que fazer com os trinta dias conseguidos com muito mérito e fiquei vagando entre a sala e a cozinha. Abria a geladeira, assistia televisão, comecei a ler um livro e não passei da terceira página, a inquietação atormentava meu espírito e então ia ao quintal alimentar os pássaros e não sabia onde estava o alpiste e acordei a minha esposa, que carinhosamente a chamava de “patroa”. Então ela acordou meio brava dizendo que estava na segunda gaveta do armário e voltou a dormir, tentei inutilmente regar aquela flor que tanto amava e estava tão linda, mas não sabia onde estava o regador e novamente a esposa foi solicitada para dizer onde estava o tal regador. Barulho de água na chaleira e inventei depois de tanto tempo fazer um café e levar para a esposa que ainda estava deitada, não sabia onde estava o pó de café e novamente acordei a linda dona do lar. Até que num determinado instante ela ficou muito zangada comigo, acordou e dirigiu-se até a cozinha e mostrou onde estava tudo aquilo que eu procurava e eu disse:
— Desculpe-me querida, estou de férias! Ela com uma cara de leão de circo disse:
— Pois, seria muito melhor se você estivesse trabalhando, pois, só assim não seria acordada a esta hora!
— Mas querida já são nove horas deste sábado ensolarado e maravilhoso!
— E dai, não sabe que meu horário de acordar são dez horas todos os dias?
Então sai vagando pelo quintal tentando encontrar o verdadeiro significado da palavra “férias” e quando pensei que tudo estava perdido e eu estava predestinado a passar as minhas férias sendo humilhado, subitamente e prontamente acordei a minha esposa e disse:
- Arruma as malas, vamos viajar para o litoral norte do estado de São Paulo agora e não se esqueça de levar aquele biquíni branco ao qual você fica muito “gostosa”! e sorri alegremente.
A minha amada sorriu e derreteu-se toda e correu fazer as malas para partirmos para nossas merecidas férias. Nossa? Claro que não, apenas a minha, a patroa não fazia nada o ano inteiro e ainda usufruía daquele maravilhoso período.
Todas as nossas malas foram colocadas no carro e foi então que eu observei que estava faltando o principal e logo gritei:
— Mas onde está a barraca de camping, querida? Ela falou nervosamente:
— Mas nós vamos acampar Luiz? e minha resposta foi lacônica:
— Sim, vamos acampar, há alguma objeção?
Humildemente ela foi até o grande porão existente na nossa casa e retirou a enorme barraca de camping e colocou sobre o carro com minha ajuda.
Entre nós arrumarmos todas as “tralhas” no velho chevette azul e eu beber algumas poucas cervejas restantes da noite anterior na geladeira demorou poucos minutos e todos estávamos preparados para “pegar” a estrada.
Novamente nossos conflitos entravam em erupção, pois, ela adorava ouvir pagode e eu admirava música popular brasileira e música clássica. Depois de vários minutos fizemos um acordo e saíamos ouvindo o maravilhoso Chico Buarque de Holanda que logo na descida da serra, na rodovia dos Tamoios foi substituído por “grandes” grupos de pagodes. Aceitei ouvir as músicas um pouco contrariado e coloquei meu inseparável protetor auricular nos ouvidos e assim os pagodeiros desceram cantando e eu dormindo sob o efeito de algumas cervejas ingeridas antes da partida e pouco eu ouvia as vozes estridentes dos “maravilhosos” cantores da minha amada.
Quantas vezes fui acordado durante a viagem e algumas perguntas foram feitas sobre o tal grupo de pagode:
— São maravilhosos, não são Luiz? referindo ao som que estava tocando no CD e eu dizia rapidamente sem olhar para minha esposa, entre uma babada e outra:
— Realmente são excelentes! Se você encontrar músicos melhores que esses avise-me por favor!
Ria alegremente e virava meu rosto para outro lado e continuava a dormir.
Quando meus sonhos pareciam tornar-se realidade eu fui acordado com o carro na areia, sendo chacoalhado para montarmos a barraca de camping. Então abri os olhos vagarosamente e vi a chuva correndo pelos vidros do carro e pedi para minha esposa procurar uma pousada qualquer mais próxima daquela praia e minha patroa chacoalhou-me novamente e disse com todas as forças do coração:
— Acorda seu fanfarrão, chegamos e é necessário montarmos a barraca! Está chovendo!
Abri a porta vagarosamente e meu corpo quente insistia para que eu ficasse mais alguns minutos dentro do carro, mas não houve acordo, todos me puxaram para fora do veículo e eu sai cambaleando para montar a bendita barraca.
Nunca, jamais, eu tinha montado uma barraca de camping em toda a minha vida e existia a grande necessidade de montarmos a barraca rapidamente, pois, a chuva insistia em não querer dar uma trégua.
Rapidamente sai a procura de algumas pessoas que pudessem nos ajudar a montar a barraca, que era enorme e consegui depois de percorrer várias barracas alguns garotos que disseram que adoravam montar barracas de camping e assim os garotos montaram a barraca quase tudo sozinhos, sob a minha supervisão, segurando uma grande lanterna para iluminar a área onde estava sendo montada a barraca de camping, sempre ingerindo alguns goles de cervejas geladas.
Agradeci aos garotos e começamos a colocar nossos colchonetes, fogão, um pequeno armário e roupas para dentro da barraca e logo após tudo estar bem arrumados ficamos muito alegres.
Quando tudo parecia tranquilo e todo o pessoal estar dormindo tive uma grande vontade de beber algumas cervejas bem geladas e sai a procura da tal cerveja e a encontrei em um quiosque na praia bem distante da nossa barraca com pessoas cantando e outras dançando e encostei meu umbigo no balcão e pedi uma cerveja bem gelada.
Apareceu uma linda garota e perguntou educadamente o que eu queria e eu disse a ela que desejava uma cerveja muito gelada para beber no balcão e prontamente fui atendido.
Após várias cervejas bebidas comecei a ensaiar os meus primeiros passos de dança, imbuídos sobre o efeito do álcool e assim continuei até que inesperadamente apareceu minha esposa com um enorme facão dizendo que iria cortar meu orgão genital. Rapidamente despedi-me de todos e segui em passos trôpegos acompanhando minha amada. Que vergonha! Não consegui esquecer minha última parceira de dança, uma moreninha maravilhosa que dançava alegremente por todo o quiosque.
Chegamos na barraca e meu colchonete foi apresentado, joguei-me pesadamente sobre o mesmo e adormeci com os passos da linda garota dançando na minha mente. Escutei um raivoso boa noite e um durma com Deus dito pela minha patroa e adormeci sonhando com as minhas férias.
No outro dia o Sol fez-se presente, levantei sorrateiramente e sentei na areia, em frente a barraca de camping e fiquei vários minutos olhando para o mar e refletindo sobre o acontecido no dia anterior e prometi para mim mesmo que a partir daquele dia não faria mais patifarias. Ficamos um mês, acampados na Praia da Mococa em Caraguatatuba, litoral norte da cidade de São Paulo e aprendi que nossos impulsos e emoções nos levam a cometer alguns absurdos como o ocorrido. Foi uma das melhores férias da minha vida! Quantas patifarias! Ela deve me odiar até hoje. Belas recordações!