domingo, 16 de agosto de 2020

O ORNITÓLOGO

  

 Existiu uma época em que eu trabalhei como porteiro num parque municipal na cidade onde moro e todos os domingos aparecia por lá um rapaz trajando calças jeans, camiseta branca, um “surrado” tênis e uma máquina fotográfica profissional e ao entrar no parque pedia permissão para poder fotografar os pássaros existentes no local.

         A primeira vez em que ele apareceu no parque o sol ainda estava preguiçosamente começando a surgir no horizonte e a tímida lua negava-se a abandonar o céu entre o chilrear dos pássaros que misturava com os barulhos das folhas das árvores que o vento fraco lançava sobre o meu escritório ao ar livre.
         Consultei a minha encarregada sobre a permanência daquele rapaz no parque e expliquei a ela que o mesmo era um ornitólogo e vinha ao parque somente para fotografar espécies raras de pássaros e ela pediu para que eu acompanhasse a permanência do ornitólogo no parque.
         Recebi a ordem com muito carinho e alegria, pois seria a primeira vez que teria a oportunidade de acompanhar um ornitólogo e aquele momento me pareceu muito apropriado para saber um pouco mais sobre pássaros e sobre a atividade daquele rapaz que a princípio mostrou-se um pouco acanhado com a minha presença ao lado dele e deu-me algumas instruções que como eu deveria comportar-me diante das situações que surgiriam a partir daquele momento.
         Seguia-o a distância e ficava atônito com tanta paciência daquele rapaz que ao ver algum pássaro raro entre as árvores, colocava o dedo indicador sobre os lábios e pedia silêncio absoluto para que o pássaro pudesse pousar delicadamente em algum galho da árvore e ele imediatamente retirava a sua potente máquina fotográfica profissional mirava para o pássaro e lá ficava eternos minutos para capturar o melhor ângulo, a melhor paisagem e eu ficava observando ao longe e ficava encantado quando escutava o barulho da máquina fotográfica sendo acionada e torcendo para que o pássaro tivesse sido fotografado e a foto tivesse uma ótima definição.
         Após fotografar o pássaro observava-o levantar-se vagarosamente e caminhar lentamente entre as árvores mexendo na máquina fotográfica e meu coração ficava muito feliz e aliviado quando observava um sorriso de felicidade no rosto do ornitólogo, pois tinha certeza que a foto tinha sido um êxito e ele imediatamente mostrava a foto através de um pequeno visor como se fosse um troféu, mexia aqui, mexia acolá na máquina e novamente ficava olhando para o topo das árvores para capturar novos pássaros que faziam uma verdadeira festa naquele lindo domingo ensolarado.
         Lá pelas nove horas da manhã, ele guardava a máquina carinhosamente colocando-a na mochila, despedia-se educadamente e retirava-se silenciosamente do parque desejando-me um bom dia e até a próxima semana.
         Então eu voltava novamente para a guarita e ficava imaginando que qualquer dia ainda iria escrever uma crônica sobre o meu amigo ornitólogo que tanto amava e ainda ama os pássaros, assim como São Francisco de Assis.O nome deste ornitólogo era Carlos Salles. Obrigado amigo!

quarta-feira, 5 de agosto de 2020

A HOMENAGEM

O casal de jovens era integrante de uma grande escola de samba da cidade de São Paulo, ela como passista e ele como tocador de pandeiro da ala bateria.
         Os ensaios eram constantes e o amor entre os dois enchiam nossos olhos de alegria e emoção em vê-los na quadra desfilando e cantando o samba enredo da escola de samba.
         Quando nos avistavam nas arquibancadas jogavam beijinhos e acenavam e ela começava a sambar sob o mavioso som do pandeiro do amado esparramando beleza de tanta felicidade.
         A alegria e o amor entre o casal era inefável e todos os integrantes da escola de samba gostavam muito do casal e quando a diretoria soube que eles casariam uma semana antes do carnaval o presidente chamou os dois até sua sala e disse que iria dar um belo presente aos dois que jamais iriam esquecer por toda a vida.
         Fomos convidados pelo jovem casal para o enlace matrimonial e um pouco antes do querido tocador de pandeiro entrar na igreja confessou que estava muito feliz por casar-se com a passista mais linda do mundo e disse que estava ansioso por saber qual presente um presidente de uma escola de samba poderia dar para um integrante da escola.
         Um pouco antes do início do casamento a igreja já estava lotada de pessoas que tanto queriam bem o jovem casal e foi dado inicio ao casamento e um grande momento de emoção foi quando o filhinho do casal entregou as alianças e saiu correndo e chorando para os braços da vovó e lá ficou a soluçar sob lágrimas dos pais e sob os olhos enternecidos de todos os presentes na igreja.
         Após o término do casamento fomos todos saindo para darmos os comprimentos aos noivos foi quando fomos surpreendidos pelos integrantes de toda a bateria da escola de samba que estavam colocados em frente à igreja e começaram a cantar o samba enredo da escola de samba daquele ano e davam algumas paradas para felicitar os noivos e após alguns minutos de grande emoção o casal foi recebido pelo presidente da escola de samba que lhes entregou uma linda medalha um grande abraço e centenas de salva de palmas ao som da bateria, várias garrafas de champanhe estouradas e uma queima de fogos maravilhosa. Lindo casamento. Bela homenagem!

HISTÓRIAS DE PAPAI

Enquanto papai não chegasse em casa não poderíamos jantar, às vezes ficava com muita raiva, devido a fome que invadia meu estômago, resignava-me num cantinho da mesa e ficava humildemente aguardando o retorno de papai e quando papai chegava em casa, levantávamos da mesa e corríamos dar um abraço e um beijo nele e pedíamos que se sentasse para jantar. Não, tínhamos que esperar papai tomar banho para iniciarmos nossa refeição. Aquele banho de papai parecia que demorava uma eternidade e meu estômago roncando, roncando. Papai sentava-se à mesa e mamãe servia o jantar, após servi-lo éramos servidos e começávamos a comer vagarosamente sempre observando a calma e o olhar de agradecimento de papai em tê-lo esperado para a janta.
                 Após a janta vinha a nossa recompensa, ficávamos algum tempo sentados num velho banco de madeira no quintal de casa ouvindo várias histórias maravilhosas contadas por papai. Jamais pedíamos para papai contar a mesma história e o repertório de histórias era vasto, mas a história que mais me impressionava era quando ele contava que por algum tempo tinha sido ajudante de carvoeiro no meio do mato. Seu relato, com voz pausada enfatizava as condições de precariedade existente naquela época e deixava-nos atônitos quanto a sua bravura em passar vários dias no meio do mato, entre bichos,  dormindo numa palhoça improvisada e colocando fogo em madeiras para virar carvão, ser ensacado e transportado para a cidade.
                 Sempre pedia detalhes sobre o que comiam, o que faziam enquanto as madeiras eram queimadas, como eles comportavam-se diante de noites chuvosas, temperaturas baixas, saudades da família. Imaginava-me no meio do mato ajudando meu avô, todo sujo de carvão  e correndo atrás de passarinhos, borboletas e a noite ouvindo o piar de corujas, pássaros estranhos e outros animais como onça, tatu, lagarto.
               Nas noites de lua cheia as histórias ficavam mais emocionantes, pois a descrição era ilustrada com algumas mulas sem cabeça, saci-pererê, curupira entre outros da nossa lenda e folclore tanto comentados pelos nossos antepassados.
              Lá pelas nove horas da noite, era hora de entrar e recolhermos para nossas camas e controlarmos nossos medos e aflições, fechar os olhos e ficar torcendo para a noite passar logo e chegar outro dia a noite para escutarmos mais histórias fantásticas. Então papai apagava a luz do lampião, dava um beijo na face de cada um de nós e recolhia-se para o seu quarto. Sempre ouvia papai conversar algumas palavras com mamãe e depois tudo se fazia silêncio, ouvíamos apenas o som de grilos e sapos que habitavam ao redor da nossa casa.Era hora de sonhar...

NÃO LEVE A VIDA TÃO A SÉRIO

Há uma receita infalível para nossa longevidade e esta receita é sorrir mais do que estamos acostumados, mas bem mais. É muito engraçado quando nós sorrimos dos nossos defeitos, das situações embaraçadas que o cotidiano nos oferece como presente por estar por aqui, vivendo, vivendo e muitas vezes esquecendo-se de ser feliz.
            Nesta semana que passou fiz um teste e deixei-me levar pelo conselho de um querido primo que disse que nossa longevidade está diretamente ligada ao nosso viver bem, deixar a vida fluir com mais naturalidade, abandonando a pressa que é nosso algoz e às vezes leva-nos a situações desagradabilíssimas.
           Os detalhes são muito importantes, quantas vezes deixamos passar um momento único em nossa vida porque estamos com pressa e não podemos perder um segundo da nossa existência, mas não lembramos que aquele momento possa ser o último neste planeta.
           Folhear aquele velho álbum de fotografia da família que faz anos que você não vê, ver como mudamos e sentir a revolução que a internet causou em nossas vidas. Afinal quem vai querer saber de um álbum de fotografia nos dias atuais se temos um álbum digital na internet, temos o “Fliker” e tantos outros recursos a nossa disposição.
          Comprar um bom jornal no domingo de manhã e sentar-se confortavelmente numa mesa e ir folheando página por página, ler o editorial, fatos políticos, regionais, a página de esporte, lazer e ficar procurando por grandes cronistas que outrora escreviam textos maravilhosos e hoje já não encontramos mais.
         Colocar uma confortável cadeira no quintal ou na varanda e ficar contando estrelas com a netinha numa noite estrelada e relembrando várias histórias que nossos antepassados nos contava faz nossa alma inflar de tanta felicidade e acrescenta milhares de pontos no nosso ranking da longevidade.
        Olhar nossos colegas de trabalho e reparar como eles são engraçados, cada um de um jeito diferente, com suas idiossincrasias, defeitos, virtudes, caras feias, caras alegres, apressados, lentos e rir disfarçadamente de situações que não estávamos acostumados a reparar até então é muito divertido!
        Poder encarar o espelho e ver aquela ruga que na semana passada não existia e não ficar desesperado, entrar em depressão, que nada, o melhor é dar uma boa gargalhada e dizer pra nós mesmos: É estou ficando velho, isto é muito bom! 
         Sair bem cedinho de bicicleta com aquele vento maravilhoso de Outono batendo no nosso rosto e pedalar sem destino e pararmos na margem de um maravilhoso rio que silenciosamente convida-nos a uma grande reflexão da seriedade desta vida.
         Sentar-se num banco de um parque, abrir aquele livro que faz tempo que está com o marcador na página vinte e nove e recomeçar a leitura silenciosamente sob o encantador e mavioso canto de pássaros e lê-lo até o fim.
         Encontrar velhos amigos e sentar-se num bar distante da grande metrópole e reviver uma época maravilhosa entre um copo e outro de cerveja faz parte do requinte do não levar a vida tão a sério.
         Ir à igreja que faz tempo que abandonamos e poder orar e agradecer tudo de bom que está acontecendo e pedir proteção para continuarmos  trilhando nosso caminho até a hora do juízo final. A fé é muito importante e uma verdadeira aliada da querida longevidade.

         Como é bom assistir a vida sobre outro ângulo de visão e prestar atenção nas pessoas que estão ao nosso redor, pois muitas vezes é apenas uma questão de pequena sincronia para sermos mais feliz, bem mais feliz do que estamos acostumados.
         Resumindo é muito importante sorrir para a vida e sorrir da vida e aproveitarmos o máximo nossa existência que Deus nos proporcionou, pois se deixarmos pra depois pode ser um pouco tarde e quando percebermos seremos acordados com um torrão de terra sobre o nosso caixão, aí amigo (a) será tarde, muito tarde e ficaremos com cara de perplexidade dizendo: “Caramba como passou rápido e eu nem sorri!” Cabe a nós calar e torcer para que exista uma outra vida para podermos dar o devido valor nesta vida e a ter levado tão a sério. Será que valeu a pena? Portanto, façamos nossa parte: Não vamos levar a vida tão a sério! Sorria!

A PENEIRA

 
E naquela noite resolvi pedir um “pouso” na casa da querida tia Terezinha em Guarulhos. A recepção foi maravilhosa e após algumas partidas de “truco”, boas conversas e risos ecoados  pela vizinhança fomos dormir sob uma garoa fina que caia lá fora.
         Os olhos ainda estavam semiabertos foi quando fiz um convite ao meu querido sobrinho Fernandinho para assistir a um jogo de futebol de outro sobrinho chamado Leonardo, que nós carinhosamente chamávamos de “Léo”, o garoto estava jogando muito futebol e iria participar de tal “peneira” que seleciona garotos para jogar num time profissional.
         Acordamos e imediatamente saímos para irmos até o Parque Ecológico do Tietê, onde aconteceria a tal “peneira” e quando chegamos ao ponto de ônibus disse ao meu sobrinho que iríamos a pé e ele quase voltou pra casa para continuar no seu belo e maravilhoso sono, parou, pensou e resolveu acompanhar o seu tio insano e lá fomos nós andando, andando e andando pela avenida Guarulhos, Ponte Alta até pegarmos a Rodovia Airton Sena sentido Rio de Janeiro.
         Durante o trajeto conversamos sobre tudo: escola, namoradas, curso de desenho, várias piadas e nada de chegar ao tal Parque Ecológico.
         A Felicidade em andarmos com jovens ao nosso lado é que nunca eles ficam cansados e sempre estão alegres e proseadores do mundo, do nada e sorriem de tudo e do nada e assim seguimos em frente sob uma tênue garoa que insistia em atrapalhar nossa caminhada para apreciar o maravilhoso e querido sobrinho Léo.
         Após duas horas caminhando sobre a Rodovia Airton Sena e deixarmos vários sorrisos para trás acabamos chegando ao Parque Ecológico do Tietê.
         A chuva já se fazia presente e posicionamos-nos atrás do alambrado esperando os garotos que disputariam quem iria poder participar de um time profissional e lá ficamos pacientemente aguardando os garotos entrarem e mostrar tudo aquilo que sabiam em matéria de futebol.
         O jogo começou e tínhamos certeza que nosso querido sobrinho Léo iria passar pela tal “peneira”, a chuva caía e os lances aconteciam...até que marcaram um gol e imediatamente fui abraçado pelo meu sobrinho Fernandinho dizendo que tinha sido um gol do nosso sobrinho Léo.
         A partida de futebol continuou e meu sobrinho fez mais um gol para nossa felicidade e tínhamos certeza que ele estaria aprovado para jogar num time profissional...
         Abraços carinhosos foram distribuídos sob a forte chuva e ficamos aguardando o resultado e com muita esperança do querido sobrinho Léo tornar-se um atleta profissional.
         Após uma semana recebemos a triste noticia que o meu sobrinho não tinha sido aprovado na tal “peneira”. A tristeza fez-se presente e eu questionei o que faltou para o garoto ser um atleta profissional: Um bom patrocinador ou talvez ser parente de um profissional do futebol. Dois gols, muita chuva pelo lombo e ainda receber um “não”....E viva o Brasil e viva os “boleiros”.
         As “peneiras” terminaram, o sonho evaporou-se pelo gramado, mas tenha uma certeza querido sobrinho Léo... você foi e sempre será o atleta do nosso coração! Parabéns pela tentativa e ficamos muito orgulhosos pela persistência! Valeu! Te amamos!

SÁBADOS

  
Belas recordações dos sábados matinais quando eu era acordado com um beijo com sabor de hortelã, um bom dia sussurrado aos meus ouvidos e o meu café era servido na cama, entre bolachas, pão com manteiga e alguns sorrisos de felicidade ouvia ao longe alguns pássaros cantando e o burburinho de carrinhos de feira passando com as donas de casa indo à feira.
         Não sabia se agradecia ou chorava, pois tudo aquilo era muito estranho ao meu cotidiano e o relacionamento tinha começado naqueles dias e ficava pensando: “Esta mulher deve gostar demais da minha pessoa” e lá estava eu a degustar o delicioso café pausado entre algumas perguntas sobre a minha semana e sorrisos alvos que iluminavam todo o quarto.
         Depois de demorados minutos degustando o meu café matinal, ela saia do quarto e ia até a sala e colocava um disco do Roberto Carlos na vitrola e todo o romantismo invadia a casa.
         Levantava-me e ia preparar minha mochila para jogar bola num campo de futebol perto de casa, era uma “pelada” que todos os sábados acontecia num campo de várzea e eu adorava ir até lá dar alguns despretensiosos chutes na surrada bola de capotão, pois jogar futebol mesmo eu não sabia, era apenas a felicidade de encontrar velhos amigos de infância que eu tinha deixado de vê-los por muito tempo.
         Após o jogo sempre acontecia um churrasco que era saboreado com muitas cervejas, vários sorrisos e muita alegria entre nós amigos de infância.
         Era hora de voltar para o meu novo lar e colocava minha mochila nas costas e caminhava lentamente, sempre observando as pessoas que pareciam não ter pressa com nada, pois os sábados são feitos para isto: Não ter pressa.
         Chegava em casa, apertava a campainha e era recebido com os braços abertos e notava que tudo estava cheirando muito gostoso, a casa limpinha e o Roberto Carlos ainda continuava a cantar, mas minha maior surpresa era quando a mesa era arrumada e minha amada pedia para eu fechar os olhos que tinha uma gratificante e deliciosa surpresa para mim: Fechava os olhos e após alguns segundos eu os abria e lá estava o meu presente: Uma Feijoada!
         Não me continha, levantava e dava um carinhoso abraço e um beijo na amada e lá estávamos nós a saborear a deliciosa feijoada e ainda sentindo o aroma agradável da casa toda limpinha. Belas recordações: Café na cama, Futebol de várzea, Faxina na casa e escutar Roberto Carlos.

LIBERDADE

  Há tempos que venho sendo acordado pelo mavioso canto de um pássaro na velha jaqueira existente no quintal da casa onde eu moro. Acordava,...