segunda-feira, 28 de setembro de 2020

OS BAILES DA VILA RÉ




Em 1970, eu era um adolescente de 15 anos e estava vivendo a melhor época de toda a minha vida, isto eu ainda não sabia, digo isto agora..., mas como todo garoto daquela época, já trabalhava com carteira assinada numa cia. de seguros, no centro da cidade de São Paulo, tinha algumas paquerinhas e adorava passar as tardes de sábados no Centro Educacional da Moóca, na piscina, e quando eu chegava em casa começava a preparar-me para ir a um baile chamado “O Cafona”, que ficava na Vila Ré, zona leste da cidade de São Paulo.

Assim que eu chegava em casa tomava um demorado banho de balde, perfumava-me com um desodorante barato e vestia uma calças boca de sino azul com listras brancas e cintura bem alta, uma camisa “Gola Olímpica”, que chamávamos carinhosamente de “Volta ao Mundo”, um sapato com saltos enormes, chamado salto carrapeta e um cinto com uma fivela imensa. Repartia meus cabelos compridos ao meio, emprestava algum dinheiro do meu pai e ia ao encontro dos amigos Israel e Luizão para encontramos as meninas mais bonitas da nossa região, nos bailes do Cafona.

Assim que eu encontrava com meus amigos eu era zombado com vários assobios, enaltecendo meus trajes e o agradável odor de perfume de quinta categoria e lá seguíamos nós em plena “louçania” dos nossos 15 anos, falando muito sobre o cotidiano, das lindas meninas que se déssemos sorte encontraríamos no baile, sorrisos altos e olhos observadores para tudo e para todos.

Após uma caminhada de uns trinta minutos, chegávamos ao Cafona e ficávamos observando as lindas meninas chegarem com os cabelos estilo Chanel, com muito “laquê”, vestidos rodados e sorrisos alegres, algumas vinham acompanhadas dos pais, o que nos deixava muito apreensivos, pois, sabíamos que seria muito difícil abordá-las.

Após alguns minutos naquele flerte, tomávamos coragem, passávamos a língua nos lábios e entrávamos sem muita purpurina. Às vezes éramos notados logo na entrada e ficava fácil bailarmos as três horas apenas com uma única menina. Isto acontecia muito raramente, pois, na maioria das vezes éramos obrigados a garimpar nosso tesouro com muito esforço, mas sempre acabava por arranjar alguma garota interessante.

Os meus amigos se davam muito bem, pois, eles eram “galinhas”, hoje o pessoal fala “pegador”, bailavam com quase todas as meninas, sem restrição, agora eu era um pouco tímido e meio “bobão”, pois, não aceitava bailar com qualquer menina e sempre escolhia as mais bonitas, o que diminuía muito minhas chances de arranjar alguma menina para dançar. Quantas vezes passava o baile todo observando os meus amigos bailando e eu bebendo guaraná e de olho em alguma “linda” e ela não dava a mínima chance de aproximação.

Quando anunciavam a última música, ficávamos desesperados para encontrar alguém, valia tudo, o importante era dançar a última música que se chamava Rock Roll Lo Lo Bye cantada por B.J.Thomas. Rostos colados e os olhares de algumas mães colados na gente, nada de grave acontecia, a não ser alguns cochichos inaudíveis prometendo vir no próximo baile e sempre enaltecendo a beleza que às vezes não condizia com a realidade, mas valia tudo, até dar alguns “pisões” nos pés das damas e ser largado em plena música. Que vergonha!

Terminada a música, dávamos um enorme suspiro e saíamos com a alma repleta de felicidade, alguns beijinhos em algumas meninas sempre prometendo o retorno no próximo final de semana e pé na estrada porque se fazia tarde, afinal tínhamos que chegar em casa antes da meia-noite.

Quantos bailes! Quantas alegrias vividas ao longo da nossa adolescência que hoje permanecem no meu coração e faz-me sentir que vivemos nossa época intensamente, com a pureza e alegria dos jovens da geração 70. Que saudades!


APRENDIZ DE AÇOUGUEIRO








 Estava eu lá despreocupado, lendo os meus gibis do Zorro, do Super Homem, do Batman, Homem Aranha, tinha apenas quatorze anos anos foi quando minha mãe chegou do açougue do senhor Mário e anunciou meu novo serviço. Iria trabalhar com o senhor Mário, um Português que tinha um açougue na esquina da rua onde morávamos, no bairro Cidade A.E.Carcalho, zona leste da cidade de São Paulo. Eu não me contive e perguntei para minha mãe:

— Mas mãe, o que vou fazer num açougue? Não sei nem cortar um pãozinho direito, imagina eu cortando pedaços de boi! minha mãe disse que já tinha combinado até quanto eu iria receber e foi então que perguntei:

— Quantos milhares de dinheiro receberei? minha mãe disse:

— Você não receberá dinheiro algum, apenas um quilo da melhor carne por dia trabalhado.

Desmanchei-me em gargalhadas e supliquei a minha mãe que desmanchasse o contrato, pois, estaria disposto a fazer qualquer outra coisa, menos trabalhar por carne, sem ver a cor do dinheiro.

Mamãe insistiu e no outro dia lá eu estava na frente do açougue do senhor Mário esperando o mesmo abrir o estabelecimento do comércio do boi.

O senhor Mário chegou, desejou-me bom dia, entramos no açougue, apresentou-me todos os compartimentos do açougue e o meu primeiro serviço foi aprender a encher linguiça.

Era muito engraçado eu colocando pedaços de carnes e passando por uma máquina e a linguiça saía prontinha do outro lado da máquina. Até que era divertido o meu serviço.

Atendia alguns fregueses, enchia a linguiça e no final do expediente ajudava a fazer uma faxina no açougue. Jamais o senhor Mário permitia que eu cortasse carne, pois, ele tinha medo de eu acidentar-me. Ao fechar o açougue o bondoso Português cortava vários bifes de primeira qualidade, embrulhava e dava para eu levar para minha casa.

Os dias foram passando, as linguiças foram sendo feitas, o açougue andava muito limpo, até que num determinado dia resolvi que não queria mais receber os meus proventos em carne e sim em dinheiro, pois, eu tinha arranjado uma namoradinha e quando íamos ao parque de diversão não podia comprar nada, pois, não aceitavam carne para pagamento. O senhor Mário falou: não há problemas, todos os dias dou um dinheiro para você, só que as carnes você não levará mais.

Fiquei muito feliz e contei a quebra de contrato para minha mãe que não gostou da troca, pois, assim que eu dava o dinheiro recebido para ela, eu tinha que voltar ao açougue ou ir ao mercadinho para comprar “mistura”.

Trabalhei muito tempo com o senhor Mário no açougue, ora recebendo o meu salário em dinheiro, ora recebendo em carne, até que ele vendeu o açougue e começou a construir uma linda casa e lá fui eu trabalhar de servente na construção da linda casa do Sr.Mário.

O senhor Mário era um ótimo patrão, um amigo de todos e gostava muito da nossa família. Bela recordação!

LIBERDADE

  Há tempos que venho sendo acordado pelo mavioso canto de um pássaro na velha jaqueira existente no quintal da casa onde eu moro. Acordava,...