segunda-feira, 20 de julho de 2020

VENDEDORES DE VASSOURAS

E novamente encontrava-me sem vínculo empregatício e via-me obrigado a encarar os “bicos da vida” para poder dar algum dinheiro para minha irmã Sônia, visto que morava em sua residência e tinha uma vergonha danada em dormir, comer e não contribuir com absolutamente nada.
          Num determinado dia convidei meu querido sobrinho Evandro para irmos até uma fábrica de vassouras e comprar algumas vassouras e rodos e sairmos pelas ruas vendendo de casa em casa.
          Imediatamente ele aceitou e lá fomos nós até a fábrica fazer a aquisição das tais vassouras que seriam vendidas no dia seguinte. Compramos uma dúzia de vassoura e uma dúzia de rodo, cada um de nós pagamos a metade do valor e combinamos que enquanto não vendêssemos todas as vassouras e rodos não voltaríamos para casa.
          No dia seguinte, bem pela manhã separamos as vassouras e os rodos e saímos batendo de porta em porta oferecendo nossos produtos para a população da Vila Maria Alta, zona norte de São Paulo.
          Inicialmente nossas vendas não estavam sendo aceitas, pois era um sábado chuvoso, aquele sábado que todos adoram dormir até um pouco  mais tarde e quando batíamos palmas ou tocávamos a campainha de alguma casa, alguns diziam palavras impróprias e de baixo calão. Mas não desistimos e continuamos oferecendo nossos higiênicos produtos e lá pelas dez horas da manhã uma moradora do bairro aceitou comprar a primeira vassoura, vendida pelo meu sobrinho Evandro.
          Meus ombros já estavam doendo muito e sentia uma vontade enorme de jogar todas aquelas vassouras e rodos no lixo e voltar para casa, mas não podia fazer nada daquilo que meu pensamento queria, pois metade do dinheiro da aquisição pertencia ao meu sobrinho.
          Sobe rua, desce rua, aperta campainha, ninguém atende e às vezes, balbuciando praguejávamos alguns moradores que nem sequer abria a porta para falar: Não obrigado, não quero!
          O relógio apontava duas horas da tarde, algumas vassouras e rodos já tinham sido vendidos e a fome aumentava, foi quando decidimos entrar num boteco para comer um lanche.  Colocamos humildemente as vassouras e os rodos em pé perto da porta do boteco e entramos para lanchar. Pedimos alguns salgadinhos, o Evandro pediu um refrigerante e eu solicitei uma cerveja bem gelada e o proprietário atendeu-nos prontamente. Conversa vai, conversa vem, oferecemos nossas vassouras para o dono do boteco que acabou ficando com uma e descontamos no pagamento da nossa conta.
          Vila Maria tornou-se pequena para nosso negócio e partimos para Vila Medeiros e os ombros latejavam de tanta dor, fomos e voltamos e conseguimos vender apenas três dos nossos produtos.
          Num determinado instante o Evandro parou perto de um Posto de gasolina, na Estrada da Conceição e anunciou que precisava retornar pra casa, pois tinha que ir viajar com sua tia e precisava da metade do lucro dos produtos.
          Tentei explicar para ele que precisávamos vender tudo para poder dividir o lucro e ele iradamente disse:
- Se o Senhor não der minha parte agora, irei denunciá-lo no Programa do Ratinho. Ri e disse calmamente a ele:
- Olha aqui garoto, não vou dar absolutamente nada pra você enquanto não vendermos todos os rodos e vassouras, ainda faltam seis unidades, e tá falado. Bóra andando que começou a garoar de novo!
          Os olhos do meu sobrinho marejaram, não sei se era de dor nas costas ou minhas ríspidas palavras que tinham ferido sua alma e então ele saiu na frente pisando duro e entrou num “cortiço” com as seis unidades dos nossos produtos. Fiquei aguardando o seu retorno e eis que o meu sobrinho subiu as escadas, sem nenhum produto e contando alegremente o dinheiro que tinha arrecadado com a venda.
          Dividimos o lucro das vendas e pedi explicações de como ele tinha vendido tão rapidamente os produtos e ele calmamente disse-me:
- Sabe tio, precisava viajar, então ofereci de porta em porta no cortiço e falava que o Senhor era muito bravo e se eu voltasse com alguma unidade quando chegasse em casa levava uma surra enorme.
          Sorri e agradeci meu sobrinho passei a mão na sua cabeça e algumas lágrimas brotaram nos meus olhos.  Ele partiu alegremente para sua viagem e eu fui beber algumas cervejas no bar, após dar uma parte do dinheiro ganho para minha irmã. Eta vidinha difícil! 

CONTROLE REMOTO

 
 Uma enorme bandeira do Palmeiras estava hasteada em frente ao bar do Jacaré, grossas fumaças subiam de uma enorme churrasqueira que fora colocada na calçada e os sorrisos de felicidade dos frequentadores misturados com boas doses de cervejas podiam ser ouvidos em todas as esquinas do bairro da Vila Maria Alta, em São Paulo.
         O clima era de final de campeonato onde o Palmeiras iria enfrentar outro time que não me recordo o nome e confesso que senti uma enorme vontade de participar daquela festança toda, mas como meu time não era o Palmeiras optei em ficar sentadinho na calçada na frente da casa da minha irmã Sônia apreciando de longe toda a algazarra dos Palmeirenses.
         Passados alguns minutos apareceu meu sobrinho Evandro no portão e fez o convite que eu estava esperando:
- O tio, que tal a gente beber algumas cervejas no bar do Jacaré e ver esta festa de perto e ainda se dermos sorte poderemos até comer um pedacinho de carne?
Rapidamente levantei-me e seguimos até o bar, pedimos licença e sentamos num banco alto de madeira e pedimos uma cerveja e com um olhar na televisão e outro no abridor fomos servidos sem muita cerimônia pelo Jacaré.
         O jogo estava começando e todos os Palmeirenses acotovelavam-se para ver a escalação do time e nós lá sentadinhos alheios a tudo e a todos. Os gritos de incentivo ao time podiam ser ouvidos a dezenas de quilômetros e subitamente meu sobrinho levantou-se e pediu para eu ficar esperando ele no bar que ele iria até em casa buscar dinheiro e voltaria rapidamente.
Passados alguns minutos lá estava meu sobrinho Evandro de volta e vinha carregando na face um sorriso “maroto”, sentou-se e perguntou quanto estava o jogo e eu disse que o jogo acabara de começar e estava zero a zero e neste exato momento derrubaram um jogador do Palmeiras na área e o juiz assinalou pênalti e pensei que o boteco vinha abaixo tamanho a alegria e felicidade dos torcedores.
         O jogador do Palmeiras tomou distância e o correu para bater o pênalti e exatamente neste instante a imagem da televisão desapareceu e entre milhares de palavrões o Jacaré correu para religar a televisão, subiu num dos bancos de madeira e ligou a televisão e foi muito aplaudido por todos.
         Perguntei ao meu sobrinho o que estava acontecendo e ele com um sorriso de satisfação meneou a cabeça e disse que não sabia de nada.
         O jogo continuava e a televisão fora desligada mais umas duas vezes antes de terminar o primeiro tempo e lá estava o Jacaré a religá-la. Alguns torcedores mais exaltados chegaram a amaldiçoar a quinta geração do dono do boteco e nós lá firme na quinta cervejinha e eis que meu sobrinho comentou:
- Tio, acho que está na hora de irmos embora, pois o pessoal já está desconfiado da gente e quando souberem que estou com o controle remoto da televisão da minha casa seremos apenas duas pessoas mortas e saímos de fininho e meu sobrinho ria alto e balançava o controle remoto. Conseguimos sobreviver para contar mais esta patifaria aprontada pelo meu querido sobrinho Evandro. Controle remoto.

LIBERDADE

  Há tempos que venho sendo acordado pelo mavioso canto de um pássaro na velha jaqueira existente no quintal da casa onde eu moro. Acordava,...